segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Tom Zé e seu lixo lógico tropicalista

Postado por Eduardo Oliveira 19.11.12

Antônio José Santana Martins, o Tom Zé, sempre gostou de explicar para confundir (como reitera em Tô, do icônico Estudando o Samba). Portanto, ainda que seja um de seus trabalhos mais acessíveis e facilmente digeríveis, Tropicália Lixo Lógico, 14º álbum de estúdio de sua carreira, carrega certa carga teórica que remete a seus trabalhos mais célebres e densos. Tom não perdeu a ousadia que sempre lhe fora característica.

Lançado em agosto de 2012 (Independente), Tropicália Lixo Lógico não foge à regra de seus álbuns anteriores e é um disco que possui uma sonoridade inspirada em diversos estilos musicais, como o baião, o forró, o samba e o rock, o qual reina em Não Tenha Ódio do Verão: “Não tenha ódio no verão/ Você vai acabar comendo brasa no tição/ Assando o rabo no fogão/Isso arrebenta uma nação!” berra o músico entre guitarras nervosas.

Para compor o disco e explicar – à sua maneira, claro – as raízes do Tropicalismo, Tom recorre a fundamentos filosóficos e históricos, demonstrando riqueza intelectual e nos fazendo refletir a cada nova audição. Por exemplo: segundo o músico, o movimento da Tropicália vem do chamado “lixo lógico”, que seria um material cerebral originado a partir do momento em que os nascidos no interior do Nordeste (assim como ele) entram em contato com a cultura ocidental e com o pensamento aristotélico, já que o raciocínio mouro, nativo, de origem oriental, era a única referência formadora de suas ideias.

O baiano explica-confunde, propondo que Gil, Caetano e os tropicalistas foram expostos, na escola, às bases do pensamento ocidental e aos alicerces racionalistas aos 6, 7 anos - estágio do conhecimento infantil quando se aprende com maior intensidade - criando um material que deixaria o córtex cerebral e se alojaria no hipotálamo. Mais tarde, ao perceberem que um mar de inovações se aproximava e a MPB precisava abraçar a modernidade, o lixo lógico deixou o hipotálamo e reinvadiu o córtex, criando esse misto de tradições e culturas. Unindo, de vez, a herança dos árabes à cultura pop ocidental.

Complicado, não? E fascinante.


Mas não é só de carga teórica excessiva que se sustenta o disco. Tom divide vocais com Mallu Magalhães na singela O Motobói e Maria Clara: “Clara Maria sonha di comprá/ Na primeira liquidação/ Os eletros/ Nosso fogão”, cantam os músicos ilustrando a história de um motobói e sua amada. Participam do disco, ainda, o rapper Emicida (Apocalipsom A), Pélico (De-De-Dei Xá-Xá-Xá), Rodrigo Amarante (NYC Subway Poetry Department) e Mallu, outra vez, na intrigante Tropicalea Jacta Est.

Mesmo após 50 anos de carreira, o baiano que fez parte do grupo de músicos que criou o álbum Tropicália ou Panis et Circensis (1968) - marco definitivo do tropicalismo musical brasileiro - de Todos os Olhos (1973) e de Estudando o Samba (1976) consegue, mais uma vez, se restabelecer no cenário musical brasileiro como um dos mais experimentais e inovadores artistas. Seu raciocínio sempre será considerado bizarro e exagerado por alguns, mas verdade seja dita: mesmo com seu complexo de épico, não há ninguém como Tom Zé. E vão ser sérios assim no inferno!

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