quarta-feira, 5 de dezembro de 2012





"Meu ideal seria escrever uma história tão engraçada que aquela moça que está doente naquela casa cinzenta quando lesse minha história no jornal risse, risse tanto que chegasse a chorar e dissesse -- "ai meu Deus, que história mais engraçada!". E então a contasse para a cozinheira e telefonasse para duas ou três amigas para contar a história; e todos a quem ela contasse rissem muito e ficassem alegremente espantados de vê-la tão alegre. Ah, que minha história fosse como um raio de sol, irresistivelmente louro, quente, vivo, em sua vida de moça reclusa, enlutada, doente. Que ela mesma ficasse admirada ouvindo o próprio riso, e depois repetisse para si própria -- "mas essa história é mesmo muito engraçada!" (...) E quando todos me perguntassem -- "mas de onde é que você tirou essa história?" -- eu responderia que ela não é minha, que eu a ouvi por acaso na rua, de um desconhecido que a contava a outro desconhecido, e que por sinal começara a contar assim: "Ontem ouvi um sujeito contar uma história...".
                                                     - Rubem Braga, escritor, um dos maiores cronistas brasileiros.


"Eu amo a rua (...) Nós somos irmãos, nós nos sentimos parecidos e iguais; nas cidades,
nas aldeias, nos povoados, não porque soframos, com a dor e os desprazeres, a lei e a polícia, mas porque nos une, nivela e agremia o amor da rua (...) Ora a rua é um fator da vida das cidades, a rua tem alma!". 
                                                        - João do Rio, jornalista, cronista, tradutor e teatrólogo brasileiro.





Logo quando iniciamos nossos estudos no campo do jornalismo, entendemos que o jornalista é um imediatista, um instantaneísta. O espaço do jornal custa tempo e dinheiro, desta forma, o profissional se utiliza de técnicas como a do lead, a objetividade, a pirâmide invertida a fim de abordar o que é importante e comercializar as notícias. Outro ponto relevante nesta analise é o de fato jornalístico. O fato jornalístico, como entende Prof. José Coelho Sobrinho, é um encadeamento de ações que se relacionam e interagem entre si: “O fato para o jornalismo é uma informação escolhida intencionalmente pelo jornalista por ser de interesse de seu público”. Em suma, a matéria gira em todo dos fatos. O dito Jornalismo Literário vem romper com esse ideário, foge do noticiário superficial, revela um universo que geralmente fica oculto nas entrelinhas das matérias cotidianas. Certa vez, em conversa com a jornalista Ethel de Paula, a atração do dito Novo Jornalismo seria adentrar mais na vida das pessoas, dos sujeitos a cima dos fatos, os textos mais longos e descritivos, além da poética eminente e a humanização do fazer jornalístico. 

É fato que a  Literatura ronda a cabeça de muita gente, dá ideias e causa uma excitação para fazer com que a palavra e o pensamento fluam, rompendo com as amarras do lead e fugindo do hard news. Porém o gênero trás algumas dificuldades, por confusões disseminadas por autores, escritores e pelo meio acadêmico sobre o que seja uma crônica e o que é um texto de jornalismo literário. O “novo jornalismo” passa a ser utilizado para designar a narrativa jornalística que utiliza técnicas literárias. Além da própria estrutura do texto, outro ponto discutido neste gênero é o da realidade e da ficção. Romper com a forma clássica ou criar personagens e ficção para explicar um caso ao leitor ainda é algo arriscado para um jovem jornalista, O Truman Capote pode, o Gabriel Garcia Marquez também, mas eles já têm nome para isso. O leitor já vai ler sabendo o que esperar daquele texto. Entretanto, a crônica jornalistica é sim essêncial ,  “Em uma sociedade pós-moderna e de informação, bombardeada a cada minuto por notícias boas e ruins; por guerras e acidentes; terremotos e tsunamis, a crônica deve servir de respiro, de um momento de reflexão e diversão para o público leitor e internauta, já que ela é rara no rádio e na televisão. É para isso que ela serve!”, afirma o professor e jornalista Luiz Roberto Saviani Rey.
 
Historicamente falando, A partir do séc. XIX, a aproximação entre literatura e jornalismo torna-se mais evidente. Nesta época, o realismo social  passa a captar – a partir da observação e da recriação detalhada do cotidiano – os costumes e a linguagem das ruas e trazê-los para o campo da ficção, a exemplo de Charles Dickens e Émile Zola. Jack London e George Orwell, por exemplo, no início do séc. XX, se reinventaram como personagens da classe pobre para viver entre sem-tetos e desafortunados, transformando suas experiências em reportagem e relato autobiográfico, respectivamente.

No Brasil, haverá o rompimento com jornalismo puramente político e o gênero literário vai se fundir com os fatos da cidade e os posicionamentos ideológicos.  Em 1852, Manoel Antônio de Almeida publica “Memórias de um sargento de milícias” nas páginas do correio mercantil, com estilo jornalístico, incorpora a linguagem das ruas, fugindo da tendência romântica da época de retratar os ambientes aristocráticos.  Incorporou o formato de folhetim, popularizado em jornais da capital do império, aportado por aqui como um dos itens da última moda em Paris. O romance urbano “A Moreninha” de Joaquim Manuel de Macedo é considerado o exemplo de folhetim mais popular da história do Brasil, tendo sido sucesso de vendas numa época em que a maioria da população do país ainda era analfabeta. O clima de suspense em que o estilo folhetinesco apostava é característica utilizada ainda atualmente em novelas. Outros escritores brasileiros como Lima Barreto, Machado de Assis, e o cearense José de Alencar tiveram obras suas publicadas em folhetins para depois serem editadas em livros. 

O crescimento da imprensa fortalezense, no século XIX, acompanhou o processo de desenvolvimento do jornalismo brasileiro tanto no aspecto cronológico, quanto nas estruturas de organização e sustentação. A divulgação de matéria literária constituiu-se de uma tradição junto à imprensa cearense, especialmente nos jornais diários que, desde cedo, dedicaram algum espaço em suas páginas para apresentar trechos de obras literárias, por meio da seção "Folhetim". Em 1816, possivelmente já circulavam as “folhas” ou “folhetos”, dos quais hoje quase não há registros. Esta seção, no entanto, destinava-se, essencialmente, a divulgar os escritos de autores estrangeiros ou de renomados escritores brasileiros; ou seja, os "clássicos" da literatura. Foi somente a partir do final da década de setenta que passou a desenvolver-se um jornalismo essencialmente vinculado à divulgação literária. Começaram a surgir agremiações, com o intuito de promover a fermentação de ideias, a produção artística e a formação de um público leitor. O estudioso Leonardo Mota datou 37 sociedades intelectuais que surgiram entre os anos de 1870 e 1900 no Ceará. Em 1892, a capital cearense foi sacudida por bulhenta novidade literária por meio das reuniões de um grupo de rapazes que se encontravam nas mesas do Café Java, um quiosque que ficava no centro de Fortaleza, para falar de literatura, nasceria então a famosa Padaria Espiritual. Além de colaborar para a consolidação das Letras no Ceará, esse movimento permitiu uma maior popularização da incipiente literatura local e regional. O jornal “O pão” serviu como instrumento de intervenção destes na realidade social cearense com a intenção de modificá-la. Através de suas publicações os padeiros sentiram-se capazes de criticar; apontar direções e; em muitos casos; modificar a realidade social em que viviam.

Mais à frente, sem mais delongas, não poderia esquecer-me da época dos grandes ensaios, do jornalismo boêmio de mesa de bar; da observação dos arquétipos sociais; do amor pela rua descrito por João do Rio; das crônicas de Nelson Rodrigues, Rubem Braga, Carlos Heitor Cony e tantos outros Jornalistas que beberam desta fonte inesgotáve, em que fluem ficções, realidades, gente, arte, histórias, política e embelezamento. A crônica, tido por muitos como um gênero genuinamente brasileiro, está  ali nas fronteiras longíquas da literatura, onde os gêneros se esfumaçam. Nessa visão embaçada é que as linhas do Jornalismo Literário é escrito com punho forte. 





Thalita Moura Vieira.

















 

 
 

 


 

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